Sismometria

Sismogramas

Sismogramas

Um sismograma é o registo temporal do sinal obtido por um sismómetro, em determinado local, a uma dada distância epicentral da fonte sísmica, a que correspondente uma componente do movimento do solo produzido pelas ondas sísmicas.
Nos primeiros tempos da sismologia, o modo mais comum de obter diretamente um registo visível era usar um tambor que rodava a velocidade constante de modo a providenciar uma escala temporal no registo. Este movimento era registado por meios mecânicos (marcador), fotográficos ou magnéticos.
A invenção dos sismómetros eletromagnéticos permitiu a conversão do sinal sísmico num sinal elétrico, embora os primeiros destes sismómetros ainda utilizassem a gravação fotográfica de dados por meio de um feixe luminoso. Os sismómetros modernos, porém, convertem o sinal elétrico para uma forma digital, através de circuitos eletrónicos de conversão analógico-digital, que são depois registados em suporte digital. Para além dos registos digitais terem maior fidelidade que os analógicos, apresentam ainda como principal vantagem o facto de já estarem “prontos” para o processamento numérico efetuado pelos computadores.
Sismograma analógico. Registo obtido em papel sobre tambor rotativo.

(Fonte: Wikipédia)

Fases do sismograma

Sismograma do terramoto de Tacoma Olympia, ocorrido a 28 de fevereiro de 2001. Distinguem-se as fases P, S e as ondas superficiais (LR).

(Fonte: IRIS)

Registos de banda larga de componente vertical, feitos na estação CLL, Alemanha, de telessismos superficiais, com distâncias epicentrais entre 18º e 157º. Quanto maior é a distância ao epicentro (eixo vertical), maior é o tempo de chegada das ondas, maior é a diferença temporal entre as fases P e S e maior é a dispersão das ondas superficiais.

(Fonte: gfz-potsdam.de)


Curvas tempo-distância para as ondas sísmicas de um sismo de foco superficial (tendo por base o modelo de velocidades IASP91). Além das ondas de volume P e S diretas, mostram-se as diferentes ondas que podem ser geradas por reflexão e refração (e difração) destas no interior da Terra. A faixa colorida nas ondas superficiais deve-se à sua dispersão. A cor vermelha assinala as fases de maior amplitude, logo mais facilmente identificadas nos sismogramas.

(Fonte: Fundamentos de Geologia. Cap. 2 - Sismologia)

Cada evento registado num sismograma é designado pelo termo de fase. O sismograma de um sismo local ou regional é, em geral, bastante simples de interpretar. As fases P e S identificam-se facilmente, tal como as ondas superficiais. O sismograma de um sismo distante é bastante complexo e a sua interpretação requer uma considerável experiência. Ele contém a chegada de numerosas ondas sísmicas que viajaram por percursos diferentes através da Terra, desde a fonte até ao recetor.
As ondas P são aquelas que se deslocam mais rapidamente e por isso são as primeiras a chegar. Assim, a primeira fase de um sismograma corresponde à chegada deste tipo de ondas. Em seguida chegam as ondas S, que habitualmente têm uma amplitude superior à amplitude das ondas P. Depois chegam as perturbações associadas às ondas superficiais (ondas com comprimento de onda muito superior, também designadas por “ondas longas”), que se caracterizam também por possuírem amplitude e período mais elevados que as ondas volúmicas. De entre as ondas longas, as ondas de Love deslocam-se com quase a mesma velocidade das ondas S à superfície e por isso chegam mais rapidamente do que as ondas de Rayleigh.
As fases detetadas nos sismogramas dependem do tipo de sensor utilizado e da orientação relativa deste em relação à direção de chegada das ondas sísmicas. Por exemplo, um sismómetro de componente vertical pode detetar ondas P, ondas SV (ondas S polarizadas na direção vertical) e ondas Rayleigh mas não deteta as ondas SH e de Love, enquanto que num sismómetro de componente horizontal se podem detetar ondas P, ondas SH (ondas S polarizadas na direção horizontal), ondas Rayleigh e ondas de Love.
A característica mais fácil de avaliar num sismograma é a duração do sinal. Esta depende sobretudo da distância entre a estação e o epicentro do sismo, pois as várias fases sísmicas que compõem o sismograma viajam a velocidades diferentes: quanto mais distante estiver a fonte, mais longo será o registo do sismo. As ondas de volume e as ondas superficiais comportam-se de maneira diferente: as ondas de volume não são dispersivas, a sua velocidade não depende do período do sinal, enquanto as ondas superficiais são dispersivas. Num registo sísmico, o grupo de ondas superficiais será tanto mais longo quanto mais distante for o sismo.
Como as ondas de volume não são dispersivas, a duração do registo destas ondas permanece aproximadamente constante, apenas a diferença temporal entre elas aumenta com a distância ao epicentro. A diferença temporal entre o início da chegada do principal grupo de ondas de volume é inferior a 3 minutos para eventos com distâncias epicentrais (∆) inferiores a 10º (cerca de 1100 km), inferior a 16 minutos para <60° (cerca de 6600 km), inferior a 30 minutos para <100° (cerca de 11100 km) e inferior a 45 min para <180° (cerca de 20000 km). Já a duração dos trens de ondas superficiais de Love e de Rayleigh, por serem dispersivas, aumenta com a distância. Para distâncias epicentrais superiores a 100° (cerca de 11100 km), estas ondas podem ser registadas durante uma hora ou mais, e para eventos muito fortes, em que as ondas de superfície podem circundar a Terra várias vezes, as suas oscilações podem ser detetadas por 6 a 12 horas, em aparelhos sensíveis de longo período (LP) ou de banda larga (BB). Mesmo para sismos regionais razoavelmente fortes (por exemplo, Ms≈6 e ≈ 10°), as oscilações destas ondas podem durar cerca de uma hora, embora a diferença de tempo entre o início das fases P e S seja de apenas cerca de 2 minutos e a diferença entre a fase P e a amplitude máxima do grupo de ondas de superfície seja de apenas 5-6 minutos.
O registo sísmico não tem apenas fases sísmicas com percursos bem identificados no interior da Terra. Tem também energia que resulta da dispersão das ondas sísmicas em múltiplos trajetos, devido a heterogeneidades existentes no meio atravessado. Esta dispersão das ondas também contribui para o alongamento do registo de um sismo, em particular das fases de ondas de volume. Numa primeira observação de um registo sísmico, a sua duração, a presença ou não de ondas superficiais dispersivas, o intervalo de tempo entre as ondas de volume e o pico das ondas superficiais, deve permitir avaliar imediatamente se se trata de um sismo local, regional ou distante. Esta avaliação será de grande ajuda na escolha da abordagem adequada, dos critérios e das ferramentas a usar numa análise mais detalhada do sismograma, para efeitos de localização da fonte e determinação da magnitude do sismo.

Interpretação de sismogramas

Atualmente os centros de dados fazem estimativas rápidas do epicentro e / ou da profundidade focal dos sismos, antes da análise detalhada dos registros. O software de análise do sismograma marca no registo os tempos de chegada teoricamente esperados para as principais fases sísmicas. No entanto, os tempos de chegada calculados através do modelo de propagação das ondas usado e o aparecimento dessas ondas, podem não coincidir, pelo que o tempo teórico de chegada de uma fase deve apenas servir de guia para a identificação da fase mas não deve influenciar de forma alguma a marcação do tempo origem dessa fase.
Assim, num centro de processamento e análise de dados de uma rede de vigilância sísmica, os operadores de serviço devem rotineiramente ser capazes de: a) reconhecer no registo a ocorrência de um sismo; b) identificar e anotar as diferentes fases sísmicas; c) determinar o início da fase e a sua polaridade de forma correta; d) medir a amplitude máxima do movimento do solo e o seu período; e) calcular o azimute e a lentidão de uma fase, e f) determinar os principais parâmetros da fonte sísmica, hipocentro, tempo de origem, magnitude, mecanismo focal, etc.
Estas tarefas são atualmente realizadas usando sismogramas em formato digital, e implicam um conhecimento adequado de todo o processo que levou à obtenção do sismograma, desde a produção do sinal sísmico na fonte, passando pela propagação das ondas sísmicas, até ao seu registo pelo instrumento, incluindo a conversão de sinal e os processos de filtragem que levaram à formação da imagem que vai ser interpretada.
Tempo de chegada, amplitude, período e polaridade:O início do registo de qualquer sismo é marcado pela chegada da onda P, por isso, a determinação das suas características corretas é de primordial importância. Em muitas redes sísmicas, os alertas rápidos são baseados apenas na leitura do tempo de chegada e na amplitude da fase P.
O reconhecimento do início de uma fase sísmica depende da razão sinal/ruído (a identificação de fases posteriores à primeira chegada é dificultada pela energia do próprio sismo em curso), das condições de visualização e da forma do sinal de origem. Por convenção, é usual classificar o início de uma fase de uma onda volúmica como impulsiva (i) ou emergente (e), consoante este seja mais pronunciado ou mais suave. Esta classificação dá uma ideia qualitativa da precisão com que a leitura pode ser feita.
A polaridade do primeiro movimento da onda P é importante para a determinação do mecanismo focal que caracteriza a fonte sísmica. Se o primeiro movimento for para cima, ele deve ser indicado como uma compressão (c) e se for para baixo, deve ser marcado como uma dilatação (d). Nos boletins sísmicos é possível encontrar a designação alternativa de "u" e "r" (u de up e r de rarefaction) usada quando as leituras são feitas nos registos de instrumentos de longo período (LP) ou de banda larga (BB). A leitura desta informação deve ser feita num registo sem filtragem ou com um filtro aplicado que distorça minimamente a forma da fase.
Critérios para a identificação de fases:A razão VP/VS, entre as velocidades de propagação das ondas P e das ondas S, é uma característica do meio relacionada com as suas propriedades elásticas e tem um valor aproximado de raiz de 3. Isto significa que a diferença tS-tP, entre os tempos de chegada das fases S e P deve variar de forma quase linear com o tempo da fase P.
Um gráfico em que se represente a diferença de tempos das fases S e P em função do tempo da fase P designa-se por diagrama de Wadati. Quando existem registos de várias estações sísmicas, este diagrama é extremamente útil para verificar a consistência na interpretação das fases de volume e facilmente detetar um erro. Quando o tempo de chegada é insuficiente para identificar uma fase sem ambiguidade, é necessário recorrer a outras características como sejam a amplitude, o período dominante ou a forma da onda.
A amplitude das ondas sísmicas varia com a distância devido ao efeito da atenuação geométrica, a efeitos de focagem resultantes da heterogeneidade do meio e devido à atenuação inelástica (absorção da energia sísmica). Enquanto a energia das ondas de volume se espalha pela superfície de uma esfera (aproximada) cada vez maior, com uma área proporcional ao quadrado do seu raio, a energia das ondas superficiais espalha-se por cilindros cada vez maiores, com uma área proporcional ao seu raio. Adicionalmente, por terem geralmente maior comprimento de onda, as ondas de superfície sofrem menor atenuação e são menos afetadas por heterogeneidades estruturais de pequena escala do que as ondas de volume. Isto significa que em sismos de foco superficial (h < 70 km), a partir de uma certa distância, os registos de banda larga ficam dominados pelas ondas superficiais. Nos sismos de foco intermédio (h > 70 km) ou de foco profundo (h > 300 km), a energia das ondas superficiais diminui drasticamente não chegando a ultrapassar a amplitude das ondas de volume. A grandes distâncias, as ondas de superfície apenas aparecem em sismogramas de aparelhos de longo período (LP) ou de banda larga (BB).
Em relação às ondas de volume, numa fonte sísmica típica, a energia das ondas S gerada na fonte é cerca de 5 vezes maior que a energia das ondas P. É de esperar por isso que a fase S seja de maior amplitude que a fase P para sismos naturais. Por outro lado, a frequência mais alta gerada como onda P é cerca de raiz de 3 vezes maior (≈1,7) que a mesma frequência para a onda S gerada. Este facto, aliado à observação de que a atenuação das ondas S (transversais) é maior que a atenuação das ondas P, contribuem para que num registo sísmico as fases P tenham um conteúdo em frequências mais altas do que as ondas S. Como consequência, as ondas S diretas e as suas múltiplas reflexões e conversões, dentro das distâncias telessísmicas, são observadas principalmente em registros de longo período (LP) ou de banda larga (BB). Já as diferentes fases da onda P, (como as fases P, PcP, PKP e PKKP), são bem registadas, até distâncias epicentrais, por sismógrafos curto período (SP), com amplitude máxima normalmente em torno de 1 Hz.
A complexidade de uma fase das ondas de volume está relacionada com a duração e complexidade da rotura sísmica que lhe deu origem. Esta duração é reduzida (inferior a 1 s) para pequenos sismos locais mas pode-se alargar a vários minutos para os grandes sismos. Para as mesmas magnitudes, os sismos profundos têm, em geral, processos de rotura mais simples e curtos, excitando mais as altas frequências do que um sismo superficial.
Explosões em pedreiras ou em minas podem originar forte atividade sísmica Os maiores destes eventos têm geralmente magnitudes locais na faixa de 2 a 4, podendo ser registados até distâncias de vários milhares de quilómetros. As explosões podem ter mecanismos de rotura simples ou complexos, consoante a forma de disparo usada. Em geral, estas explosões não geram ondas transversais (S) na fonte e por isso as ondas S que são observadas resultarão de conversões de energia e devem ter menor amplitude que as ondas S de um sismo equivalente. Assim, a relação entre as amplitudes das ondas P e S, em explosões químicas ou explosões nucleares subterrâneas, é geralmente maior do que em sismos tectónicos, que têm essencialmente origem em fraturas por cisalhamento.
Polarização das ondas:Pela sua própria natureza, todas as ondas sísmicas, de volume ou superficiais, são polarizadas. Apesar do registo sísmico ser feito segundo os 3 eixos geográficos S→N, W→E e Z (sentido positivo para cima), a interpretação da polarização das ondas é mais clara quando os eixos horizontais são substituídos pela direção R (radial, sentido positivo na direção da fonte) e pela direção T (transversal, sentido positivo para a direita quando de frente para a fonte). As ondas P e S estão linearmente polarizadas (com pequenos desvios desta situação ideal, devido ao facto da Terra não ser heterogénea e ser parcialmente anisotrópica). As ondas de superfície podem ser linearmente polarizadas no plano horizontal perpendicular à direção de propagação da onda (polarização transversal; direção T; por exemplo, ondas de Love) ou elipticamente polarizadas no plano vertical, orientado na direção radial (R) de propagação das ondas (ondas de Rayleigh).
Assim, neste sistema de eixos (R, T, Z), as ondas P apresentam polarização linear no plano (R, Z), as ondas SH e as ondas de Love estão polarizadas segundo a direção T, as ondas SV estão polarizadas no plano (R, Z) e as ondas de Rayleigh estarão também polarizadas no plano (R, Z). Se for conhecido o epicentro, uma rotação do registo sísmico nas direções (R, T, Z) pode ser um auxiliar precioso na identificação e marcação de fases.
As fases P e todos os seus múltiplos, reflexões e conversões (incluindo a fase SKS que contêm um trajeto no núcleo externo) mantêm as mesmas características de polarização no plano (R, Z). As fases S, têm inicialmente energia nas 3 componentes (SV e SH), mas as reflexões sucessivas à superfície tendem a reforçar a polarização SH enquanto que a energia SV se perde por conversão em fases SP. Por isso, as fases SS, SSS etc., apresentam um carácter fortemente polarizado no eixo T.
A informação registada num sismograma reflete a influência combinada da fonte sísmica, do meio de propagação, da resposta do instrumento de gravação e do ruído ambiente no local de instalação.

(Fonte: Curso Formadores IPMA. Cap. 8)


Exemplo de marcação do tempo de chegada da fase P e medição da sua polaridade (c - compressão), amplitude máxima (A) e período (T), para uma onda impulsiva (i). O dobro da amplitude da fase (2A), marcada entre dois extremos consecutivos do ciclo de maior amplitude que pertence a essa fase, permite calcular a amplitude (A). O período da fase (T) será o dobro do intervalo entre esses dois picos consecutivos

(Fonte: gfz-potsdam.de)


Registro de 3 componentes, filtrado, feito pela estação CLL (Δ=70,6°) do terramoto (Mw=6,7) de foco profundo (h=592 km), ocorrido a 1 de outubro de 2013, sob o mar de Okhotsk.Observam-se as formas de onda bastante impulsivas das ondas de volume P e S com fases de profundidade bem desenvolvidas. A indicação mais óbvia, num sismograma, de que um grande terramoto tem foco profundo é a pequena amplitude das ondas de superfície relativamente à amplitude das ondas de volume e a forma frequentemente simples das onda P e S, com início geralmente impulsivo.

(Fonte: gfz-potsdam.de)


Sismogramas de 3 componentes de dois eventos sísmicos ocorridos sensivelmente à mesma distância: (em cima) sismo induzido por exploração minera (Δ=80 km); (em baixo) sismo tectónico local (Δ=110 km).Em geral, as explosões não geram ondas transversais na fonte, pelo que a relação entre as amplitudes das ondas P e S, em explosões químicas ou explosões nucleares subterrâneas é maior do que em sismos tectónicos.

(Fonte: gfz-potsdam.de)


Sismogramas com registos de deslocamento de dois eventos sísmicos, sensivelmente à mesma distância (40º), obtidos na estação Moxa (MOX), na Alemanha: (em cima) sismo tectónico (mb=5.9) com epicentro na ilha de Jan Mayen, Noruega; (em baixo) explosão nuclear subterrânea (UNE, underground nuclear explosion) no campo de testes de Semipalatinsk, no Cazaquistão, de magnitude comparável.Na fonte, uma explosão nuclear é um processo mais simples e bastante mais curto do que uma rotura sísmica numa falha. Assim, as formas de onda P destas explosões são mais curtas, têm frequências predominantes maiores, e são geralmente mais impulsivas do que as dos sismos tectónicos. Além disso, as UNE geram ondas S e de superfície de menor amplitude do que sismos da mesma magnitude.

(Fonte: gfz-potsdam.de)


Sismograma das três componentes de um registo de longo período do terramoto de 9 de outubro de 1998, na Nicarágua registrado na estação MOX (Δ=86,5°). As componentes horizontais foram rodadas no sistema de eixos (R, T, Z), sendo R a componente radial na direção da fonte, para facilitar a identificação de algumas fases. O sismograma mostra fases de longo período P, PP, SKS, SP, SS e ondas de superfície L (ou LQ para a onda de Love) e R (ou LR para a onda de Rayleigh).

(Fonte: gfz-potsdam.de)