Sismos

Ondas sísmicas

Ondas sísmicas como ondas elásticas

Quando ocorre um sismo, a energia libertada é propagada em todas as direções sob a forma de ondas mecânicas (elásticas) que se denominam ondas sísmicas. Embora se admita que a perturbação sísmica se propaga através de um deslocamento elástico do meio, isto não é verdade nas imediações da fonte sísmica (onde as partículas são permanentemente deslocadas em relação à posição das partículas vizinhas, devido à rotura da rocha). Para além de uma certa distância da zona de rotura, é aceitável admitir que as ondas sísmicas se propagam apenas devido à deformação elástica do meio (deformação reversível, quando sujeito à ação de forças exteriores, recuperando a forma original após estas forças exteriores deixam de existir).
As ondas sísmicas consistem na propagação de movimentos vibratórios elásticos das partículas constituintes das rochas, que se transmitem segundo superfícies concêntricas, devido à libertação súbita de energia no foco sísmico. Estas vibrações são oscilações localizadas das partículas, em geral, numa pequena região do espaço, efetuadas em torno de um centro de equilíbrio. O modelo físico mais simples deste movimento vibratório é o oscilador harmónico. As vibrações harmónicas são caracterizadas pela sua amplitude, A (valor máximo do afastamento, y, da partícula em relação ao equilíbrio) e pelo seu período, T (tempo necessário para um movimento vibratório, ou seja, o tempo decorrido entre duas amplitudes consecutivas) ou pela sua frequência, f (o inverso do período, isto é, o número de vibrações por segundo, ou o número de amplitudes consecutivas observadas num segundo). A frequência angular do movimento periódico, ω, é dada por ω=2πf.
Como qualquer onda, as ondas sísmicas são fenómenos oscilatórios onde ocorre propagação de energia sem que se verifique transporte de matéria. Embora sejam ondas complexas, é útil aproximá-las a ondas sinusoidais monocromáticas, isto é, perturbações do meio que podem ser matematicamente descritas por uma função seno ou cosseno. Para representar de forma esquemática a propagação de ondas, podem ser usados dois conceitos relacionados: 1) frente de onda - região do espaço que reúne todos os pontos da onda que se encontram no mesmo estado de vibração. Diz-se que estes pontos têm a mesma fase ou estão em fase. Para ondas que se propagam num meio unidimensional (por ex., uma onda numa corda), as frentes de onda são geralmente pontos, em ondas planas (que se propagam numa superfície) são linhas e em ondas tridimensionais (que se propagam num volume), são superfícies. 2) raio de onda - linha orientada perpendicular às frentes de onda, que indica a orientação da propagação da onda.
Os principais parâmetros que caracterizam as ondas são:
  • Período (T) – Intervalo de tempo que decorre entre a passagem de duas cristas (ou duas cavas) sucessivas por um dado ponto fixo (unidade SI: segundo, s);
  • Frequência (f) – Número de cristas (ou de cavas) que passa por um ponto fixo em cada segundo; a frequência é o inverso do período: f = 1 / T (unidade SI: hertz, Hz);
  • Comprimento de onda (λ) – Distância entre duas cristas (ou duas cavas) sucessivas da onda (unidade SI: metro, m);
  • Amplitude (A) – Corresponde a metade da diferença vertical entre a crista e a cava adjacentes da onda;

O comprimento de onda (λ) traduz a periodicidade da perturbação no espaço, enquanto o período (T) traduz essa periodicidade no domínio do tempo. Uma vez que que o comprimento de onda (λ) é a distância percorrida pela onda exatamente durante um período (T), a velocidade de propagação da onda (v) é dada por v=λ/T ou por v= λf.
A periodicidade temporal (t) de uma onda sinusoidal pode ser expressa como: y(t) = A sin (ωt + φ) e a periodicidade espacial (x) da onda pode ser representada como: y(x) = A sin (ωx + φ), onde A é a amplitude da oscilação, ω=2πf=2π/T (rad/s) é a frequência angular e φ (rad) é a fase inicial.
Quanto à relação entre a direção de vibração das partículas e a direção de propagação da onda, estas podem ser classificadas em:
  • Ondas longitudinais - são aquelas em que a vibração ocorre na mesma direção em que a onda se propaga; são exemplos de ondas longitudinais as ondas sonoras no ar;
  • Ondas transversais - são aquelas em que a vibração é perpendicular à direção de propagação da onda; são exemplos de ondas transversais as ondas numa corda, ondas eletromagnéticas ou as ondas sísmicas S.

Em ótica geométrica, a propagação de ondas obedece a dois princípios:
Assim, quando uma frente de onda atinge uma interface de separação entre dois meios diferentes, cada ponto da interface atingido pela onda gera novas ondas (princípio de Huygens). Uma vez que a velocidade de propagação da onda depende das características do meio, de modo a manter o tempo mínimo de percurso (Principio de Fermat), a onda altera (em geral) a sua direção de propagação. Estes dois princípios (que são equivalentes) permitem explicar diversos fenómenos ondulatórios como a reflexão ou refração de ondas, e deduzir as leis que os regulam:
  • Reflexão - consiste no retorno de uma onda ao meio de origem quando esta incide numa interface entre os dois meios; ocorre (geralmente) com mudança de direção da frente de onda. Desta forma, não há alteração da velocidade de propagação (que depende do meio), nem da frequência (que depende da fonte); o comprimento da onda incidente é igual ao comprimento da onda refletida. Segundo a lei da reflexão, o ângulo em que a onda incide na superfície (ângulo de incidência) é igual ao ângulo em que ela é refletida (ângulo de reflexão);
  • Refração - consiste na passagem (transmissão) de uma onda de um meio para outro, quando esta incide numa interface entre os dois meios; ocorre (geralmente) com mudança de direção da frente de onda. Há alteração da velocidade de propagação da onda (já que esta depende do meio), o que leva a uma alteração do comprimento de onda, sem que haja alteração da frequência da onda. Chama-se índice de refração de uma onda num meio, ao quociente (adimensional) entre a velocidade de propagação da onda no vazio (constante: 300 000 km/s) e a velocidade de propagação da onda nesse meio. Designando por n1 o índice de refração do meio de origem da onda e por n2 o índice de refração do meio para o qual esta é transmitida, o ângulo de incidência (θi) e o ângulo de refração (θt) estão relacionados pela lei de Snell-Descartes:
n1 sinθi = n2 sinθt.
  • Reflexão interna total - quando uma onda atinge a interface de um meio onde a sua velocidade de propagação é maior (menor índice de refração), e ocorre o fenómeno de refração, há um ângulo de incidência para o qual a onda refratada se propaga na interface entre os dois meios (ângulo de refração de 90º): ocorre refração crítica. Este ângulo de incidência é dominado ângulo crítico. Para ângulos de incidência superiores a este, deixa de haver refração, passando a haver apenas reflexão.

As ondas transversais (ondas eletromagnéticas ou ondas mecânicas transversais) podem sofrer um fenómeno chamado polarização. Numa onda transversal, a direção de oscilação é perpendicular à direção de propagação da onda, mas nas ondas não polarizadas, a direção em que ocorre essa vibração, no plano perpendicular, não está confinada, podendo ter qualquer orientação nesse plano. Quando uma onda sofre polarização, a direção de vibração fica restringida a um único plano (a polarização especifica a orientação geométrica das oscilações). As ondas sísmicas S podem sofrer polarização vertical (SV; as vibrações transversais ocorrem apenas no plano vertical) ou polarização horizontal (SH; as vibrações transversais ocorrem apenas no plano horizontal).
Movimento harmónico simples. Aquando da propagação das ondas sísmicas devido à deformação elástica do meio, o movimento oscilatório de cada partícula do material rochoso pode ser considerado harmónico. A representação temporal desse movimento é uma sinusoide [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: le.ac.uk)


Periodicidade temporal de uma onda sinusoidal. Esta periodicidade pode ser expressa como: y(t)=Asin(ωt+φ).O gráfico representa o afastamento, y, de uma partícula do meio, em relação ao equilíbrio, em função do tempo (t).


Periodicidade espacial de uma onda sinusoidal. Esta periodicidade pode ser expressa como: y(x)=Asin(ωx+φ).O gráfico representa um instantâneo que mostra o afastamento, y, de cada partícula do meio, em relação ao equilíbrio, ao longo de uma direção (x).


Ondas longitudinais (vibração das partículas perpendicular à direção de propagação da onda) e ondas transversais (vibração das partículas na direção de propagação da onda [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: Physics Lens)


Reflexão e refração de uma onda (representada por frentes de onda e pelos raios de onda) na interface entre dois meios. Os ângulos de incidência (θi), de reflexão (θr) e de refração (θt) são medidos em relação à normal (perpendicular ao plano de separação dos meios). Segundo as leis da reflexão e da refração: θir e n1sinθi=n2sinθt (lei de Snell-Descartes). As grandezas n1 e n2 são os índices de refração dos meios 1 e 2 (quociente entre a velocidade de propagação da onda no vazio e nesse meio).

(Fonte: UFPR)


Quando uma onda se propaga para um meio onde a sua velocidade é maior (menor índice de refração), refrata-se, afastando-se da normal (θri). A partir de um certo ângulo de incidência, θc (ângulo crítico), deixa de haver reflexão (ocorre reflexão total). Para o ângulo de incidência críticoc) ocorre refração crítica.

(Fonte: demonstracoes.fisica.ufmg.br)


Polarização de uma onda transversal. A polarização limitou a vibração transversal a uma única orientação geométrica, neste caso, o plano vertical (polarização vertical).

(Fonte: Physics Open Lab)

Ondas sísmicas

Raio sísmico e frente de onda.

(Fonte: Fundamentos de Geologia. Cap. 2 - Sismologia)


Propagação de ondas sísmicas volúmicas (ondas P e S) e superficiais. As ondas S (a azul) apenas se propagam na parte sólida da Terra. As ondas superficiais (a amarelo) propagam-se paralelamente à superfície terrestre.

(Fonte: wonderfulengineering.com)

Os sismos geram diferentes tipos de ondas que se propagam com velocidades diferentes; os seus diferentes tempos de chegada às estações sísmicas ajudam os cientistas a localizar o hipocentro do sismo. As ondas sísmicas também sofrem refração ou reflexão, como quaisquer outras ondas, fenómenos que têm sido usados em pesquisas sobre a estrutura do interior da Terra. Chama-se frente de onda à superfície definida por todos os pontos da onda que se encontram no mesmo estado de vibração (isto é, têm a mesma fase). A direção perpendicular à frente de onda designa-se por raio sísmico.
As ondas sísmicas dividem-se em dois grupos:
  • Ondas volúmicas ou ondas internas - ondas que têm origem na falha sísmica e se propagam em todas as direções no interior da Terra. Uma vez que estas ondas têm propagação tridimensional, a sua energia vai-se espalhando por superfícies progressivamente maiores, cuja área é proporcional ao quadrado da distância à fonte. Sendo a energia das ondas proporcional ao quadrado da sua amplitude (E∝A^2), a energia destas ondas diminui com o quadrado da distância à fonte e a sua amplitude diminui proporcionalmente com essa distância;
  • Ondas superficiais ou ondas longas - ondas que se propagam junto à superfície da Terra. Estas ondas resultam do acoplamento e interferência entre ondas de volume (ondas P e S), quando estas atingem a superfície da Terra ou superfícies de descontinuidade no seu interior. As frentes de onda das ondas superficiais propagam-se perpendicularmente à superfície e, em geral, a sua amplitude diminui exponencialmente com a profundidade. A sua energia vai-se espalhando por uma superfície cilíndrica (e não esférica) sucessivamente maior, logo, devido à dispersão geométrica, a energia destas ondas diminui proporcionalmente com a distância à fonte, enquanto a sua amplitude diminui com o inverso do quadrado desta distância. Isto significa que com a distância, as ondas superficiais atenuam mais lentamente do que as ondas de volume, por isso, a grande distância do epicentro, os sismogramas são dominados pelo registo das ondas superficiais, cuja amplitude aí é maior que a das ondas de volume.
Quando ocorre uma rotura sísmica numa falha, uma parte da energia propaga-se através do meio sob a forma de ondas volúmicas (ondas P e ondas S), e outra parte da energia desloca-se paralelamente à superfície sob a forma de ondas superficiais (ondas de Rayleigh e ondas de Love).

(Fonte: IDL)

Ondas volúmicas: ondas P e ondas S

As ondas volúmicas são ondas tridimensionais que se propagam radialmente desde o local de origem (epicentro) e estão sujeitas a vários fenómenos de refração e de reflexão consoante as densidades dos materiais que atravessam e as superfícies que os separam. As ondas sísmicas volúmicas têm, na sua origem, uma vasta gama de frequências. Todavia, devido à atenuação sofrida durante a propagação, as mais pronunciadas têm frequências entre 0,5 e 20 Hz.
As principais ondas sísmicas volúmicas são:
  • Ondas P ou ondas primárias - são ondas de compressão longitudinais (comprimem e distendem alternadamente as rochas, na direção de propagação, com amplitudes e períodos baixos, alterando o seu volume mas não a sua forma). São as primeiras ondas sísmicas registadas pelos sismómetros porque a sua velocidade de propagação é superior à das outras ondas sísmicas (daí a designação de ondas primárias). São cerca de 1,7 vezes mais rápidas do que as ondas S e a sua velocidade varia em função da densidade e da rigidez dos materiais que atravessam; a sua velocidade na crusta continental é de aproximadamente 6 km/s e na crusta oceânica, de cerca de 7 km/s. Estas ondas propagam-se em todos os meios (sólidos, líquidos ou gasosos), sendo as responsáveis pelo ruído que pode acompanhar o sismo; no ar, estas ondas de pressão tomam a forma de ondas sonoras e propagam-se à velocidade do som. Normalmente são menos destrutivas do que as ondas que se lhe seguem (ondas S, R e L). Ao contrário do que sucede nos fluídos, em que a onda provoca alternância de compressões e rarefações hidrostáticas (os fluídos não suportam tensões de cisalhamento, logo não têm rigidez; módulo de rigidez ou de cisalhamento, µ=0), nos sólidos, as compressões e rarefações na direção longitudinal são acompanhados por tensões transversais, que provocam a dilatação ou contração transversal do meio, de acordo com a razão de Poisson.

  • Ondas S ou ondas secundárias - são ondas transversais, de cizalhamento ou de corte (deslocam a matéria perpendicularmente à direção de propagação da onda, deformando as rochas sem alterar, no entanto, o seu volume). No caso de serem polarizadas horizontalmente, o solo move-se alternadamente para a direita e para a esquerda, o que pode provocar elevado poder destruidor. Como os fluidos (líquidos e gases) não suportam forças de cizalhamento, estas ondas propagam-se apenas na parte sólida da Terra. São as segundas ondas sísmicas registadas pelos sismómetros (daí a designação de ondas secundárias), sendo a sua velocidade de propagação cerca de 60% da velocidade das ondas P; a sua velocidade de propagação na crusta continental é de aproximadamente 2,8 km/s, e na crusta oceânica, aproximadamente 3,8 km/s. A amplitude das ondas S é várias vezes superior à amplitude das ondas P.
Propagação das ondas P [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: ics.purdue.edu)


Propagação das ondas S [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: ics.purdue.edu)


Velocidades de propagação das ondas P e S em alguns materiais existentes na crosta terrestre.

(Fonte: Fundamentos de Geologia. Cap. 2 - Sismologia)

Ondas superficiais: ondas L e ondas R

Propagação das ondas de Love [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: ics.purdue.edu)


Propagação das ondas de Rayleigh [clicar na imagem para aceder à animação].

(Fonte: ics.purdue.edu)

As ondas superficiais propagam-se na parte superficial da Terra, deslocando-se com velocidades inferiores às das ondas volúmicas. Geram-se devido à chegada das ondas volúmicas à superfície da Terra. As ondas superficiais têm, em geral, frequências menores do que as ondas volúmicas, tipicamente inferiores a 1 Hz. Devido à sua baixa frequência, longa duração e grande amplitude, podem ser das ondas sísmicas mais destrutivas.
As principais ondas sísmicas superficiais são:
  • Ondas L ou ondas de Love - resultam da interação das ondas SH (ondas S polarizadas horizontalmente) com a camada superficial, sendo portanto o resultado da interferência de duas ondas S. Propagam-se horizontalmente na camada superficial, originando o movimento das partículas apenas no plano horizontal e na direção transversal à direção de propagação da onda (são essencialmente ondas de cizalhamento polarizadas horizontalmente). Apenas se propagam em meios sólidos e a sua energia permanece nas camadas superiores da Terra por ocorrer reflexão interna total. São ligeiramente mais rápidas do que as ondas de Rayleigh e são bastante destrutivas, afetando preferencialmente os alicerces dos edifícios. A designação “ondas de Love” provém do nome do matemático e geofísico inglês, Augustus Edward Hough Love (1863-1940), que em 1911 desenvolveu um modelo matemático para estas ondas;

  • Ondas R ou ondas de Rayleigh - propagam-se em meios sólidos e líquidos provocando um movimento das partículas do meio como numa vaga oceânica. O movimento das partículas individuais descreve uma elipse retrógrada, de cima para baixo, no plano vertical. Podem ser visualizadas como uma combinação de vibrações de tipo P e S, uma vez que resultam da interação entre ondas P e ondas SV (ondas S com polarização vertical) com a superfície da Terra. Tal como nas ondas do mar, o deslocamento das partículas não está confinado apenas à superfície livre do meio, sendo as partículas abaixo da superfície também afetadas pela passagem da onda. A sua amplitude decresce exponencialmente com a profundidade e grande parte da energia encontra-se confinada junto à superfície. Tal como as ondas de Love, caracterizam-se por sofrer dispersão em meios heterogéneos. São as ondas mais lentas e as mais destrutivas. A designação “ondas de Rayleigh” advém do título do físico e matemático inglês, John William Strutt, Lord Rayleigh (1842-1919), Prémio Nobel da Física em 1904, que previu a sua existência em 1885.